quinta-feira, 12 de julho de 2012

Pensando - 18/04/2003


           Cada vez se fala mais que a educação em nosso país está cada dia pior. É comum ouvir-se críticas de todos os lados. Alunos, professores e sociedade analisam a situação e normalmente, cobra-se das outras partes a ineficiência da educação. Entre nós, adultos, a tendência é de se sobrevalorizar o nosso tempo de estudantes, nossa aplicação aos estudos, nosso silêncio em sala de aula, a autoridade (ou seria autoritarismo?) do sistema.
           Pergunto-me sempre: será que esse sistema funcionaria nos dias de hoje? Duvido. Não acredito que tenha sido a escola a mudar. O que mudou foi o mundo. E isso não vai ter retorno. Não adianta reclamar que o aluno vem muito deseducado (mal-educado?) de casa. Temos é que descobrir como trabalhar isso. As famílias estão desestruturadas mesmo e não há milagre que modifique isso. Há muitas crianças sendo criadas só pelas mães ou pelos avós. Há muitas crianças sendo criadas sozinhas em lares em que o pai e a mãe têm que trabalhar. Há muitas famílias que não sabem educar seus filhos, não sabem conseguir o respeito e nem respeitar as crianças... Obediência é um conceito inexistente na maioria das vezes.
               Trabalho como professor no ensino noturno com alunos na faixa dos dezesseis anos. É grande o número de estudantes que, por um motivo ou outro, já perdeu pelo menos um ano escolar. Quase todos estão pelo menos um pouco defasado. Muitos trabalham e estudam. A maioria não tem atração nem preocupação com o aprendizado. Parece impossível para o professor diagnosticar e sanar os problemas dos alunos. A tentativa de conscientização de que o estudo é a sua ponte para a ascensão social, ou pelo impedir uma queda, é feita todo momento e não surte efeito. Emaranhados em dificuldades pessoais, limitações e falta de interesse; vão, professores e alunos, passando o ano escolar e rendendo muito aquém das possibilidades e necessidades.
               Num dia desses, bati um papo com os alunos sobre a guerra do EUA, o imperialismo e a situação do Brasil no contexto mundial numa linguagem bem simplificada para o entendimento de todos. Milagrosamente houve bastante interesse e alguém perguntou o que é necessário para que o Brasil pague sua dívida externa. Aproveitei o gancho para falar sobre a balança comercial, blocos econômicos e globalização da economia. Tudo isso em português claro, evitando o economês. E mais uma vez, aproveitei também a oportunidade para falar da necessidade que todos, governo, população e sobretudo alunos, valorizem a educação. Só com ela poderemos revolucionar o país, torná-lo mais produtivo e competitivo. Menos corrupto e menos desperdiçador de seus recursos e de sua produção.
             Durante alguns segundos brilhou uma luz nos olhos de alguns alunos. E alguns desses eram os desinteressados... Se conseguíssemos esse entendimento da importância da educação talvez nos animaríamos mais com o país. Dá tristeza imaginar a quantidade de dinheiro que é gasto em educação atingindo resultados tão pequenos. Que sonho seria transformar o investimento em resultados! Se conseguíssemos ao menos ensinar nossos alunos sobre a necessidade de pensar a cada ato, a cada situação. Tenho a impressão de que nossos alunos acham que não precisam pensar. Ao anotar uma matéria, acham que podem conversar todos ao mesmo tempo, sem que isso impeça o aprendizado. Na verdade, acham que não precisam pensar sobre a matéria. Que o simples fato de copiar (quando o fazem) garante o dever cumprido. E que não é necessário aprender. Quando há algum exercício, é comum copiá-lo e aguardar a correção do professor. Ou buscar a resposta de um colega. Quando se dispõem a resolvê-lo querem um exemplo pronto para não precisar raciocinar. Normalmente o enunciado da questão é irresolvível para muitos, que não conseguem entender o que se pede no exercício. Parece ainda não saber que estão ali para aprender, ou se sabem, acham que aprenderão por osmose, ou por milagre.
               É nesse ponto que não conformo com a idéia da escola antiga, a escola do meu tempo. Não acho que aquela escola funcionaria hoje. Não ensinaria esses alunos a pensar, não despertaria o interesse deles. Não acredito que o poder que nossa geração tem de argumentar, questionar e avaliar as coisas tenham vindo daquele modelo educacional gerado pelo regime militar pós 64. A escola nos deu uma boa base, mas nosso desenvolvimento foi pessoal e extracurricular. Aprendemos em leituras e bate-papos, alguns em mal-afamados botequins. Aprendemos a raciocinar porque tínhamos necessidade disso. Aprendemos para poder criticar, num momento em que apenas a razão poderia justificar a crítica. Sem bons argumentos, nossos questionamentos seriam derrubados pela lógica do sistema. Hoje não. Hoje todos acham que podem e devem criticar, ou melhor, colocar defeitos e reivindicar direitos inexistentes. Não há reflexão. Não há embasamento. Há apenas a crítica pura. Já que hoje a crítica é permitida, não se desenvolvem argumentos. Apenas critica-se e nem sempre o que deve ser criticado. Talvez seja isso. Talvez o problema seja o excesso de crítica. E a ausência de autocrítica.

Nenhum comentário:

Postar um comentário