quinta-feira, 13 de junho de 2013

Para o Frio Que Vem

Ronaldo Amorim

Hummm, mas que vontade de nem tirar as mãos dos bolsos para digitar esse texto! Que frio que foi esse que chegou por esses dias??
A gente já sabe e até espera que ele chegue mais ou menos nessa época, mas nem por isso, deixamos de reclamar: é a água do chuveiro que não esquenta, são os pés que ficam gelados, são os lábios que se trincam. É a cama que está gelada, é a preguiça que aumenta, é o agasalho que é pouco. Reclamamos! Que pena ter de levantar cedo, que raiva ter de ir trabalhar, onde é que estão minhas meias. Lamentamos.
            Ora, deixemos de mau humor e vamos procurar as satisfações do inverno... Não consegue? Esforce-se um pouquinho. Vou colocar dez exemplos aqui. Vá lendo um pouquinho de meus prazeres dessa época gelada e tente encontrar o que você gosta de fazer nesses dias em que o sol se distancia de nós:
1.      Tomar chá mate. Minha receita predileta é fazer o chá com uma colher de sopa de mate e uma colher de café de erva-doce. Mas tem de ser adoçado com açúcar. Tomo qualquer coisa com adoçante, mas chá, tem de ser com açúcar.
2.      Um bom filme com pipocas. Muito legal ficar em casa, debaixo de um cobertor, vendo na telinha um filme legal. Tem filme para todos os gostos, e, às vezes, vale a pena assistir novamente a um filme que você gostou e ter a oportunidade de descobrir novos detalhes.
3.      Tomar um (ou dois) caldo de feijão. Para esse, não tenho receita, não sei fazer. Mas aquele caldo com pedaços de queijo derretendo dentro, com cheiro verde por cima e guarnecido por alguns torresmos e torradas, é de se tomar rezando!
4.      Uma variação muito boa para o caldo acima é o caldo de ervilha (ou caldo verde). Cozinha-se a ervilha seca até derreter, junta-se pedaços de bacon e lingüiça calabresa, hum... dos deuses.
5.      E para beber, vinho. Minha preferência é pelos secos ou meio-secos. Nada de vinho doce. A temperatura deve ser um pouco abaixo do ambiente, porque o efeito sempre vai esquentar. Outra versão pode ser a do vinho quente. Meu pai fazia com um xarope, que podia ser usado também para fazer quentão. Gengibre, cravo e canela (êh, Gabriela). Açúcar queimado e fogo para aquecer. No vinho quente vão também frutas picadas, maçãs, pêras, uvas passas, laranjas. De dar água na boca!
6.      Roupas quentes. Quem é esperto já tira as roupas de frio do guarda-roupa mais cedo para tirar o cheiro de guardado. E a gente abusa das blusas, entramos moles nos moletons. Cachecóis, pulôveres, pantufas. Passar o final de semana nos pijamas, agasalhar as orelhas nas toucas. Hum, que quentinho!
7.      E se o frio for muito, ou se chegar da rua necessitado, beba com moderação, mas pode apelar para uma cachacinha da boa. Com muito gosto, pode mandar uma dose de um conhaque (que seja pelo menos um Domecq), afinal, ninguém é de ferro. E você não é pingüim de geladeira.Mas não faça desculpa para bebedeira. Salud, compañero!
8.      Fim de semana com amigos? Encomende uma boa feijoada (Toca de tatu, lingüiça e paio e boi zebu, rabada com angu, rabo-de-saia, como diz João Bosco), com laranja bahiana e couve picada bem fininha (isso eu sei fazer). Outra boa pedida é a vaca atolada, aquela costela cozida com mandioca até desmanchar e virar uma coisa só. Falta doce? Que tal uma canjicada da boa, com milho amarelo e amendoim torrado e moído e leite de curral? Para incrementar, um pouco de coco ralado. Nem Mike Jagger vai poder dizer que não tem satisfação. Para ser mais completa, só se tiver ambulância na porta para prevenir congestão.
9.      Quer saber de mais uma coisa boa? Enrolar para se levantar de manhã. Ficar colocando soneca no relógio e ficar adiando a despedida dos cobertores. Rola, enrolar, cobrir a cabeça, só levantar na última hora, mesmo que depois tenha de sair correndo, com o café pela metade e esquecendo chaves, documentos, deveres. Hmmm (bocejos)
10.  E para o último fica o melhor. O que há de melhor para um dia frio do que o amor? Ficar com seu amor, fazer amor, se aquecer no seu amor? Abraços e carinhos e beijinhos sem ter fim. Porque tudo que foi dito acima, fica muito melhor com a pessoa certa ao seu lado, não é?
Tá aí, dez coisas boas para o frio, para curti-lo ou para enfrentá-lo. Com certeza, vai ser muito melhor do que reclamar dele. Bom proveito para vocês.

Deixa Que Eu Conto

                                                                                        Ronaldo Amorim

Era uma vez um homem que era também um menino. E que gostava muito de histórias contadas porque desde há muito tempo, a mãe lhe contara histórias. E eram histórias lindas como devem ser os sonhos das borboletas, as aspirações das fadas, os desejos dos seres encantados.
            Ainda quando ele era um bebê (ele tem uma vaga lembrança disso tudo)a mãe o colocava no colo das irmãs e descortinava frente a eles o horizonte de seus contos, com seus príncipes e suas carruagens de abóboras.
            Fora dos contos, o tempo passou e ele cresceu vivendo sua história. A mãe morreu, as irmãs se casaram e as histórias diminuíam cada vez mais. Encontrou semi-princesas que viraram bruxas e quase-bruxas que se fingiam princesas. Foi feliz, apesar de sempre sentir uma pontinha de angústia. As histórias escasseavam. Ninguém lhe contava mais histórias. No máximo, ouviam a história dele. História sem graça, feita de esperanças e interrogações.
            Ele continuava sua vida e seu poço de angústias crescia sem que ele percebesse. Nunca matou um dragão! Nunca se deparou com uma princesa adormecida para beijar! Encontrava sapos, mas não os beijava. Não por serem feios, mas porque no máximo,, virariam príncipes. E ele ansiava era pela princesa.
            Sempre que podia, ouvia histórias. Buscava no cinema, no teatro, nos livros. Vivia procurando quem contasse histórias. E foi assim, que um dia, de passagem por uma cidade estranha, ele viu uma moça contando a história de Rapunzel. A voz terna lhe recordou o tempo de infância, o colo materno. A moça era linda! Tinha longos cabelos dourados. Ele até pediu para tocar, para ver se eram de verdade... e eram!
            Ele não sabia se estava encantado ou encontado (em um conto????), mas fez o pedido óbvio, trocando palavras: “Moça, lança-me suas melenas!”. E ela, desdizendo sua personagem, falou: “Não, essa história já existe. Caminhe comigo e vamos fazer o nosso próprio conto de fadas.”
            De  seus relacionamentos anteriores não se tem mais notícia. Talvez as outras pessoas tenham ido para outros contos, tenham se desencantado ou estejam Por aí, procurando seu destino. Mas ele não teve mais agonias. Encontrou sua princesa e passa suas noites tecendo-lhe lindas tranças de ouro.
                                                                                                                                                MCMXCV