segunda-feira, 16 de julho de 2012

Do Que É Feito Um Itauense? - 13/09/2003

                 Foi nos anos setenta que, vivendo minha adolescência e juventude, descobri o mundo real e as coisas que importavam. Até 1975, morava em outra cidade, mas vinha sempre em Itaú, visitar a família de minha mãe. Passei um ano morando em Itaú e depois fui estudar em Franca, voltando quase todo final de semana para Itaú. Vem dessa época a minha fascinação por essa cidade e seus moradores e foi esse o motivo que me trouxe de volta em 1986, após morar seis anos em São Paulo. Vim para cá para fundar minha casa, criar meus filhos e viver na cidade de meus sonhos.
                 Identifico em nosso povo um sentimento de carinho e amor pela cidade, que nem sempre é expressado, mas fica vivo dentro do peito, e em algumas situações se manifesta. Principalmente na distância, o itauense sente um comichão, uma inquietação que não sabe explicar: é o banzo, a saudade da terra. São nossos umbigos enterrados nesse chão a nos chamar...

                 Desde que convivo com essa cidade, me pego a tentar entender as pessoas daqui. Há muito tempo noto uma diferença, um jeito próprio, parecido com qualquer cidadezinha do interior e ao mesmo tempo, moderno. Muito mineira em várias coisas e meio paulista em outras. Inserida em todos os movimentos que a modernidade traz e ao mesmo tempo criando maneirismos próprios, gírias e tendências só encontradas aqui. O itauense é um mosaico que falta ainda explicar. Afinal, do que é feito um itauense?
                 Acho que posso me arriscar a compor uma receita. Vamos aos ingredientes:

                 Uma boa dose de garra e teimosia na conquista de objetivos, herança do trabalho de nossos antepassados, de sua saga de arrancar pedras, queimá-las lentamente para obter a cal e vender para os construtores sentindo-se o mais esperto dos negociantes: ganhar dinheiro em troca de pedra queimada.
                 Uma porção de simplicidade devido a nossa origem rural, ecos dos indígenas que habitaram essa região em eras remotas. Nossa ligação com a terra, com o trabalho de plantar e colher gera uma confiança de que tudo dará certo pois a terra não nos abandona.
                 Algumas colheres de hospitalidade, pois o itauense se acostumou a receber pessoas de fora. Primeiro os construtores da fábrica, seus engenheiros e trabalhadores. Depois as famílias das terras alagadas pela Represa de Furnas e até hoje uma leva grande de descendentes de japoneses, italianos, espanhóis e as mais diversas etnias. Trabalhadores braçais e especializados; médicos, dentistas, transportadores. Quando acolhe uma pessoa, na verdade o itauense está retribuindo a boa acolhida que teve em outro tempo.
                 Umas boas pitadas de envolvimento com a política, sem conseguir separar muito bem a Política maiúscula com a politicagem ordinária. Esse envolvimento, proveniente de décadas de luta pela emancipação da cidade, marcou-nos profundamente e até os dias atuais, a paixão política é destaque na caracterização do itauense.
                 É preciso acrescentar também uma dose de comodismo, oriundo do tempo em que a Fábrica de Cimento provia casas, água, eletricidade, futebol, clube, assistência médica e outros benefícios. Curiosamente, me parece que esse comportamento também gerou pessoas generosas, caridosas e preocupadas com o bem estar dos outros.
                 Para temperar, colheradas de religiosidade de um povo marcado por padres e pastores fervorosos e envolvidos com seus rebanhos. Acrescente a gosto um faro comercial das tradicionais famílias de comerciantes, o gosto pela arte e cultura de nossos congadeiros, pintores, músicos, escritores. A garra de nossos esportistas, a saudade de nossas matas sufocadas por eucaliptos, a dureza dos telhados antigos cobertos pelo pó das chaminés,
                 Misture tudo isso e deixe descansar sob o cansaço do trabalho bem feito. Unte com a bondade e sabedoria popular. Deixe exposto ao calor humano de nossa gente e comece a notar as cores surgindo em reflexos de rostos de diversas formas e gerações. O saboroso resultado será um ser humano da mais especial linhagem. Um itauense, principal responsável pela grandeza dessa nossa pequena cidade. Um representante desse povo que faz dessa cidade o melhor lugar do mundo, porque nos acolhe e nos dá espaço para viver e construir, juntos, o sonho de cada um.

Está crônica foi escrita para ser publicada no suplemento especial da Folha da Manhã sobre o 16° aniversário de Itaú.

Ronaldo é funcionário público, professor de Língua Portuguesa e sindicalista. É apaixonado por Itaú e sua gente.

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