quinta-feira, 12 de julho de 2012

De Volta ao Crime - 01/02/2003


               E de repente, como se tivesse despertado sem susto de um sonho nem bom nem ruim, chegou a sexta feira e acabaram-se minhas férias.
               Foram vinte de dias de ócio (sim, porque os dez restantes eu vendi, vilipendiei, prostituí, troquei pelo vil metal, mercenarizei-me - oh, vergonha das vergonhas!), foram vinte dias de não fazer nada. Nem o que era necessário e obrigatório, nem o que era opcional. Até mesmo algumas coisas que gosto (que na verdade gosto muito).
               Chuva teve demais, o que é uma boa desculpa para adiar obrigações. Cogumelos brotaram pelos ombros e alma meio embolorada, repousava em mergulhos em câmara lenta e a vontade submergia na penumbra e os olhos ficavam fitando o cinzento da paisagem e passaram-se um dia, dois, três... Não saía porque podia chover. Não saí porque choveu. Fiquei apenas fazendo companhia para mim mesmo, encontro esperado e demorado, bem aproveitado. Nem pensar é bom. Só deixar o tempo passar e adiar um pouco a satisfação. Para ter o que esperar.
               Um beija-flor passou por aqui. Bateu asas, exibiu suas furta-cores, brilhos e iridescências. Rodeou, pousou. Flores se ofereceram brancas, amarelas, cor de rosas, vermelhas. Zuuuuuummmm beija-flor, néctar dos melhores, flor vermelha perfumada, pétalas azuis na noite. Beija-flor se assustou? Volta beija-flor. Água e mel estão lhe esperando.
               Estou de volta, submergindo da digressão. O que este beija-flor tem a ver com a história? Quem souber que explique. Quem quiser que conte outra. Mas é só um insight. Um clarão, uma idéia que atravessa, de repente, o fio do pensamento e vai para o papel, codificado = código ficado, transformado em código. Uma digressão. O cérebro pisca, desliga-se do que estava maquinando e mergulha num raciocínio novo (velho?), novelo de idéias que se desenrola para o papel (sim, por incrível que pareça, só pra contrariar estou escrevendo à moda antiga - papel e caneta - ih! vou ter que digitar tudo depois e, provavelmente vou mudar um punhado de palavras). Exercício de sanidade, o pensar.
               Você já cometeu o seu crime de hoje? Eu, bom escoteiro às avessas, já executei o meu roubo diário. Relutei a princípio, evitei. Mas o dever falou mais alto, as férias se acabaram... Vesti meu uniforme de fora-de-férias, minha couraça, entrei no meu tanque de guerra (God Save the Iraq) e parti para o ataque. Ok. Vida fácil, fácil. Dolce Vita. Ouro para os meus cofres.
               Das férias sobraram algumas prendas para guardar. Estou reaprendendo a dirigir com o treinamento de minha filha para tirar carteira de motorista. E a sua voz quando me pergunta "Ficou bom, pai?" é um dos sons mais doces que tenho ouvido. Mais doce que Helen Reddy cantando I Don´t Know How to Love Him no filme Jesus Cristo Superstar. E o sorriso dela quando as coisas dão certo ilumina qualquer dia por mais chuvoso que esteja.
               Outra dádiva de férias foi uma chuva que tomei com meu filho, andando sem preocupação e sem pressa pela rua enquanto as gotas iam empapando cabelos e roupas e eu tornei a ser a criança sem medo de ficar resfriado, sem preocupação de ficar com a roupa molhada, mas com a alma limpa.
               PS. Neste domingo é aniversário da Laura, uma das amigas de minha filha e uma das leitoras dessas crônicas. Foi para mim uma grande satisfação saber que Laura me lê e mais do que isso, gosta de meus escritos. Laura tem duas coisas que me agradam. Seu nome que lembra ouro. Intuo que Laura deve significar "a de ouro" e ela é. Outra coisa é a sua beleza plácida que eu chamaria de egípcia. Laura, parabéns para você. Continue sendo Laura.

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