quarta-feira, 11 de julho de 2012

Meu Filho Faz Dezessete Anos - 23/08/2002


E então, porque é absolutamente inevitável, meu filho, você chegou aos dezessete anos. Não vou repetir o chavão de que você se tornou um homem. Você sempre foi um Homem, desde o dia em que nasceu contrariando a expectativa da médica que afirmava ser uma menina. Ao longo desses anos, procuro descobrir a pessoa que existe na pessoa do Gabriel. 
         Quando você era pequeno, eu gostava de dizer que você era o menino que eu gostaria de ter sido. Acho que ainda vou invejar o adulto que você será. Vejo você vivendo coisas que eu já vivi e reagindo, às vezes, com as reações que tive. Me pergunto como te ensinei a cometer os mesmos erros que eu. A reagir de forma não muito racional. Se isso foi junto com meus gametas, ou se foi transmitido no silêncio que nós dois cultivamos, e que não é uma forma de isolamento e sim uma maneira de evidenciar outras formas de comunicação, como se o silêncio fosse um canal de ligação para iniciados, um código secreto cheio de significâncias onde coisas que não se traduzem em palavras são trocadas. 
           Encontro em você defeitos semelhantes aos meus e nem sempre consigo lamentar isso. Parece que nós temos um pouco de orgulho desses defeitos, o que no fundo é que marca a nossa individualidade, a nossa personalidade. Essa sua indecisão quanto ao futuro povoou a minha cabeça quando eu tinha sua idade, e povoa ainda nos dias de hoje, quando ainda não sei tomar decisões e quase sempre, nem sei direito o que quero. Por isso, evito de dar muitos palpites, por medo de causar mais insegurança do que antes. Se pudesse, lhe daria hoje um pouco da minha paciência e da minha irresponsabilidade e lhe diria para não se preocupar demais. As coisas chegam no lugar. Um dia ou outro elas se encaminham. Sei que é difícil esperar por isso aos dezessete anos, quando temos uma ânsia enorme de vida. Sei que é difícil para quem tem o inconformismo e a teimosia que temos. Essa teimosia que nos causa ainda muitos problemas. Talvez você não tenha encontrado ainda o alvo do inconformismo, um objetivo pelo qual ser teimoso (como eu ainda procuro). Mas é assim que vamos realizando as coisas. As vezes demonstramos insatisfação com pessoas que nada têm de culpa. É um erro nosso, mas é um caminho para encontrar nosso objetivo, nossa ideologia, nosso cavalo de batalha.
          Queria lhe dizer que admiro a pessoa que você é. Que admiro sua fascinação pelo conhecimento, por saber fazer as coisas, por aprender a fazer sozinho, contando com o seu conhecimento e o seu raciocínio. Quero afirmar que não desejo me orgulhar de saber mais do que você e que fico feliz quando você me ensina algo, como me reensinou a gostar de pescar, assim como meu pai gostava. Meu desejo é que você me supere infinitas vezes, principalmente na felicidade, esse sonho que buscamos incessantemente.
         Admiro o seu gosto pela música, mesmo que você não entenda meus Elomares e eu não entenda seus Linkin' Parks, mas me comovo quando vejo você ouvindo algumas coisas interessantes, independentes do gosto da maioria do pessoal. Sobretudo admiro sua rejeição pela música de massa. Não precisa gostar de minhas músicas. Apenas selecione o que há de melhor no estilo de música que você gosta. E se possível, lembre-se de algumas coisas que seu pai ouve. Um dia, talvez, você me entenda mais e poderá passar isso para o filho que terá um dia...
          Admiro e invejo o seu namoro, apesar de me preocupar com vocês, com a seriedade do relacionamento e tenho medo de que vocês se machuquem um pouco. Esse é um aprendizado que só a vida ensina: o amor é uma aventura que deixa marcas, e algumas delas podem doer um pouco. Se acontecer um dia com você, saiba que estarei ao seu lado, talvez sem saber, mais uma vez, o que falar. Mas presente com o meu silêncio e com as minhas cicatrizes.
          Saiba que há coisas que são um alívio, um bálsamo nos ferimentos que a vida deixa. O abraço que você e sua irmã me deram no Dia dos Pais foi assim. Quero agradecer a presença de vocês em minha vida. E agradecer por ter essa coragem de romper, de avançar que são fundamentais para ser feliz e fazer feliz.
         Tenho lá em casa um litro de conhaque que eu comprei quando você nasceu. Ele também está fazendo dezessete anos. Não vai ser dessa vez que vamos abri-lo, mas espero um dia tomarmos uma dose, comemorando algo tão importante para você como foi o seu nascimento para mim.
           Quero dizer que sou fascinado, apaixonado por vocês e que lamento não viver falando isso. Mas você sabe como é isso... Acho que você também é um pouco assim. (Mais uma vez, aquele silêncio cheio de entrelinhas...)
                    Meu filho Gabriel, feliz aniversário!


PS: Para quem não conhece, recomendo a leitura do poema "Pedro, Meu Filho" de Vinícius de Moraes. Para quem é pai, vai ser pai um dia, ou um dia teve pai. Leia, fale, decore, escreva. Viva.


 Ronaldo Amorim Teixeira é pai de Clara e Gabriel e agradece a Deus por isso. 

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