domingo, 28 de abril de 2013

Iára, a Bela

            Em minha crônica anterior, contei pra vocês sobre meu amigo, Tony, the Lawyer. Nem conto pra vocês ( ops! Na verdade já estou contando...). Foi uma cobrança geral, todo mundo querendo aparecer aqui nesse espaço. Calma, pessoal. Um de cada vez. Como dizia aquele meu antigo professor de química “para cair no buraco, não precisa pressa”. Há de haver oportunidade para todos. Nem que a gente tenha de criar o bolsa-crônica, com direito a inserção por cotas...
            Pressionado pela reivindicação geral, acabei sugestionado a contar para vocês a triste história de Iára, como vocês já sabem, cognominada a Bela.
            Já de cara, confirmo a vocês que sei que as regras do bom português  não mandam acentuar a palavra Iara, mas no caso da Bela, lá está o acento, a marcar-lhe a letra “a”, marcar sua virtude e sua desgraça. Também como nos ensina a gramática da língua pátria (e também a Dona Célia, quando pertinente), a acentuação de nomes próprios foge às regras gerais e depende da maneira como foi registrada. Assim, se o Seo Antônio Domingues registrou com acento, não vamos ser nós que vamos retirá-lo, não é, Mêire Lucia? Respeitemos as regras e a criatividade dos antigos oficiais dos Cartórios de Registro Civil, que registram diversos tipos de luízes a nos confundir, com S, com Z, com e sem acentos. Respeitemos também os acasos, como aconteceu com Millôr Fernandes, que teve seu nome de Milton transformado em Millôr, graças ao deslocamento do “corte” da letra T para cima da letra O. Daí foi só um engraçadinho ler como Millôr e virou nome. Com acento e tudo.
            Com Iára, não sei o que ocorreu. Só sei que quando eu a conheci, já conheci com acento. Na verdade ainda não tinha notado esse detalhe até que um dia, trocando mensagens de texto com ele, percebi que ela acentuava o verbo pára. Foi aí que comecei a prestar atenção nela e a perceber porque a chamavam de a Bela. O fato de usar o acento diferencial me evocava aquelas alunas que uniam uma beleza rara (ah, Iára), com a graça de serem estudiosas e entenderem todas as lições, mesmo a complicada gramática das acentuações, suas regras e suas exceções! Ah, as primeiras-alunas da classe, sonho dos garotos adolescentes, com dificuldades nos aprendizados, sobretudo no aprendizado dos primeiros namoros, frustrados quase sempre pelas inatingíveis alunas-modelo da sala. Iára, seus acentos e seus óculos a nos lembra as paixões adolescentes pelas professoras lindas, protagonistas de nossos sonhos infantis. Seus acentos, suas lições e sua beleza, a tirar nosso sossego (e nossas notas).
            Quem poderia dizer que Iára, a Bela, pudesse cair em desgraça??? E não é que num dia qualquer, o Brasil resolver assinar um tal de Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, e assim, de repente, o acento no imperativo do verbo parar deixou de existir, passou a ser errado. O que era marca positiva para Iára, que a diferenciava pela correção, passou a ser uma marca do engano, do antigo, do retrógrado. E Iára deixou de ser vista como a bela. Ao invés de ser comparada com as alunas bela e estudiosa, com a professora jovem e linda, passou a lembrar a professora chata, que deixava de ver nossa criatividade, nosso esforço, nossa vontade de aprender e vivia a nos chamar a atenção “Você não aprende, não é, menino? Quantas vezes vou ter de explicar??” Passou a lembrar a colega maldosa, que corria para responder as perguntas dos professores na frente de todo mundo, não deixando ninguém mais participar. Lembrava a aluna que sabia tudo, mas não ajudava os colegas, podendo citar todas as regras devidamente decoradas, sem vida, sem coração.
            Iára continuou a usar a acentuação em seu nome. Teimosa, continua a usar o acento diferencial no verbo pára, mas de Bela, só lhe restou o epíteto.

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