Ronaldo Amorim
Agora que já passou um pouco a “febre” de manifestações no Brasil, arrisco-me a emitir algumas opiniões. Aviso que pode gerar polêmica, como qualquer opinião que possua questionamentos.
Em primeiro lugar, quero deixar claro que apoio manifestações populares. Aprendi política através de questionamento e acho extremamente positiva a coragem de expor críticas, principalmente contra o comodismo. Estive nas manifestações das Diretas Já, quando ainda vivíamos sob a ditadura militar, participei de várias manifestações públicas em Itaú e Passos, fazendo parte da organização de algumas delas,, mas acredito que as manifestações recentes também comportam críticas. Não vou nem perder tempo de criticar os baderneiros que aproveitaram o momento para promover violência e saque. Quero me ater mesmo às reivindicações de algumas delas. Parece até difícil isolar os motivos que levaram as pessoas às ruas. São tantos! Merecem aplausos as reclamações sobre a corrupção, esse câncer que corrói a administração pública. Não há justificativa para não apoiar. O Brasil melhoraria muito se conseguíssemos eliminá-la Só não soa honesto apoiar a luta contra a corrupção nacional e fingir que não vê a corrupção local, como a vergonhosa compra de votos ocorrida em cada eleição de Itaú, dessa vez comprovada por escutas telefônicas autorizadas. Não é honesto falar da corrupção entre políticos e ser tolerante quando ela nos traz vantagens pessoais.
Me lembro da luta pela anistia aos presos políticos, quando a palavra de ordem era “anistia ampla, geral e irrestrita”. A luta contra a corrupção também deveria ser ampla, geral e irrestrita (e não apenas quando convém). Qualquer coisa menos do que isso é traição à coragem dos manifestantes honestos que foram às ruas.
A luta pela redução das tarifas de ônibus também me animou por ser uma reivindicação geral, que atenderia várias classes sociais, principalmente as de baixa renda. Mas vou polemizar ao discordar da tarifa zero. As pessoas parecem se esquecer de uma regra básica, que, normalmente, aprendemos na infância: nada cai do céu. Não existe nada de graça. Quando recebemos um brinde, podemos ter certeza de que o custo dele está embutido em outro produto. Não há milagre! Se for criada a tarifa zero, o dinheiro para custear os serviços terá de sair de outro lugar, ou deixará de ser investido em outro lugar. Não se iludam que os empresários concordarão em deixar de ganhar dinheiro para que estudantes andem de graça nos ônibus. Nem políticos corruptos abrirão mão de suas propinas em favor da educação. Nem diminuirão seus salários... Na real: a população mesmo é que vai pagar, de forma indireta ou mesmo na passagem dos pagantes dos ônibus. Isso aconteceu no caso das meias-entradas para estudantes em cinemas, teatros e shows. Como eram muitos estudantes, o custo passou a ser rateado entre os não-estudantes. A meia-entrada passou a custar o valor real e quem não é estudante paga um absurdo.
Acho engraçado. Muita gente critica o bolsa-família, implementado por Lula e ampliado por Dilma, afirma que está se criando acomodados (como se recebessem uma fortuna e como se esse dinheiro não voltasse à economia por meio de compras, na maioria em produtos básicos e na economia local). Essas mesmas pessoas, que acham que deveriam acabar com o bolsa-família, aplaudem a luta pela tarifa zero nos ônibus.
Ora, querem investir na educação? Invistam nas escolas, nos professores, em pesquisas. Transporte ajuda o estudante, mas eleva o nível de ensino? Não fechemos os olhos ao que foi feito, ao financiamento escolar, ao fabuloso PROUNI, que permite o acesso de alunos de baixa renda em faculdades particulares.
Parece que virou moda protestar, mas o fato de unir multidões não garante ter razão. Não é por conseguir para o trânsito em uma rodovia (ou várias) que nos dá o direito de pagar combustível mais barato, ou não pagar pedágio. A luta é legítima, mas tem de ter lógica. Questionar o valor do pedágio, comparar com outras estradas, examinar o lucro das concessionárias, criticar a falta de investimento é legal. Mas é preciso ter argumentos. Não só número de manifestantes ou poder de ocupar.
Achei muito inteligente a tão criticada intervenção da Presidenta Dilma ao sugerir o plebiscito. Considero que se perdeu tempo e energia ao discutir se seria plebiscito, referendo ou consulta popular. Acho que a idéia de Dilma foi colocar em discussão com um público extremamente crítico (os manifestantes) a inércia de deputados e senadores, que estão enrolando a reforma política há muito tempo. Era um convite para que os manifestantes abraçassem essa causa também, discutissem os pontos polêmicos e exigissem posicionamento dos seus representantes. Seria uma bela luta. E também com ótimos resultados para o Brasil.